30 outubro 2008

desfasamento e não “desfazamento”


Quem não hesitou já na grafia de palavras que incluem o som consonântico /z/, cuja representação gráfica tanto se faz por meio da letra s como do z propriamente dito (e escrito)?

Não falo de “cazas”, nem de “coizas” – palavras em relação às quais só quem acaba de aprender a escrever tem dúvidas. Mas entre os cozidos (ao lume) e os cosidos (com linha e agulha), já há muitos adultos que param para pensar. Ou, pior, que não param e escolhem a letra errada, sem darem por isso.

E o “desfazamento”? É uma tentação a que cada vez mais portugueses têm cedido!

Mas se desfasar é «desordenar as fases» (des + fase + ar), não há motivo para enganos. Afinal, quantos de nós escreveríamos “faze” em vez de fase?

28 outubro 2008

Prémio N[ó]bel ou Nob[é]l?

Bem sabemos que a pronúncia que por aí “grasna” é: N[ó]bel. Mas há duas boas razões para a pronúncia ser Nob[é]l:
1. Trata-se de uma palavra aguda, isto é, tem acento tónico na última sílaba, tal como: papel, anel, animal, etc. Se nobel tivesse a tónica na sílaba no, teria de ter obrigatoriamente acento gráfico na vogal o (reparem que, por exemplo, túnel tem acento no u).
2. A segunda boa razão é a etimologia: Nobel é o nome do senhor sueco – Alfred Nobel – que instituiu o prémio, e a pronúncia original deste apelido era precisamente Nob[é]l.

22 outubro 2008

O mal-aventurado verbo PRECAVER


O verbo precaver, que deriva do latim (praecavere), não está conjugado da mesma forma – PASMEMOS! - nos diversos dicionários de verbos portugueses. Não sendo dependente do verbo ver, do verbo haver, nem do verbo vir, a sua flexão suscita dúvidas e há controvérsia entre os linguistas.

Uns consideram que precaver é um verbo defectivo, só se conjugando nas formas em que a sílaba tónica está depois da raiz (tendo apenas duas flexões no Presente do Indicativo: precavemos e precaveis) e nenhuma no Presente do Conjuntivo. Outros, porém, defendem que precaver se pode conjugar em todos os tempos e pessoas, pelo que o Dicionário dos Verbos Portugueses da Porto Editora, assim como o Priberam (Texto Editores) apresentam formas como (eu) “precavo”, (tu) precaves, (que ele) “precava”.

Pessoalmente, não me agrada nada esta falta de coerência entre os dicionários, assim como não me convencem as formas “precavo”, “precava”, etc., que, apesar de estarem atestadas, não se usam.

Aconselharia, portanto, a substituição de precaver pelo verbo prevenir, sempre que o tempo/modo ou pessoa/número dão lugar à controvérsia.

20 outubro 2008

Ginginha ou ginjinha?


Não foi por ter bebido demasiado
do licor que dá nome ao estabelecimento
que ficou tudo turvo, desfocado,
mas por estar o carro em andamento!

Talvez aquele que escreveu,
tenha, sim, bebido uma garrafinha!
Porque, se é da ginja que deriva,
então, só pode ser ginjinha!

16 outubro 2008

Sofrerão os portugueses de falta de criatividade linguística?



A propósito de um artigo de Manuel Gonçalves da Silva, publicado no Diário Económico, cujo conteúdo subscrevo na íntegra e cuja leitura recomendo, chego a esta conclusão: falta-nos ousadia e criatividade no que toca ao uso da língua.

Que somos (cada vez mais) servis na adopção de estrangeirismos é inegável, é evidente. Ora são as pens, os downloads, os sites e os browsers, ora são os piercings, os liftings, os brushings, mas também os “graffitis” (este plural duplo é de arrepiar), os gangs, o shopping, o jogging, o mailing, o briefing, eu sei lá. Só sei que o inglês fica a ganhar falantes e, dentro do inglês, os nomes terminados em –ing são os mais populares.

E porquê?

Por preguiça mental, por incapacidade de tradução, por se fazer gala em usar termos estrangeiros (fica tão bem saber falar estrangeiro...) - muitas vezes incompreensíveis para quem ouve - mas decerto também por falta de imaginação e até por falta de ousadia.

O “elevator pitch” de que fala o autor do artigo é, realmente, uma expressão difícil de traduzir. Trata-se de uma exposição muito rápida de um projecto, com o objectivo de conseguir que o interlocutor – um financiador – se interesse por ele. O nome vem da circunstância de, tipicamente, estes mini-discursos de argumentação acontecerem nos elevadores, quando os jovens empresários tinham a oportunidade de encontrar um possível financiador e apenas 30 segundos, mais coisa menos coisa, para os tentar convencer a apoiar os seus projectos. Lembram-se de um programa da RTP2 chamado Audax? Era mais ou menos isso.

Então, hoje, em Portugal, chama-se (pasmem) elevator pitch a uma exposição desse tipo. Mas será assim tão difícil encontrar uma expressão válida em português para designar a mesma coisa? Que tal “apresentação-relâmpago”? A mim parece-me bem. Sugestivo e eficaz.

O problema é que não pega. Porque os portugueses não gostam de falar a sua língua, ao que parece...

14 outubro 2008

O que será melhor?

«É bom que ele se precaveja»

«É bom que ele se precava»

ou

«É bom que ele se previna»?

09 outubro 2008

Aguando e desaguando



Que os rios desaguam no mar, já toda a gente sabe. Talvez seja esse o significado mais óbvio e imediato do verbo desaguar: vazar ou lançar as águas.


Mas desaguar também tem um outro sentido, essencialmente popular e porventura característico de determinados falares regionais: trata-se de «dar alguma coisa a comer (a crianças ou animais) para não aguardarem», segundo o Dicionário on-line Texto Editores.


«Toma lá um pedacito de pão, para desaguares», diz a avó para a neta. E faz todo o sentido: se quando estamos cheios de fome e, à vista da comida, até ficamos “com água na boca” (saliva, pois claro); esse pedaço de pão serve precisamente para a enxugar – ou desaguar! Afinal, o prefixo des- acarreta o sentido de “acção contrária”. Neste caso, o contrário de aguar.


E por falar em aguar e desaguar, vou mas é almoçar!

06 outubro 2008

Borradas e burradas


Em linguagem coloquial, diz-se por vezes que alguém fez uma burrada/borrada, quando o resultado da sua acção é desastroso ou pelo menos lamentável. E como se trata de um termo que se diz muito mais do que se escreve, surgem as dúvidas quando pretendemos registá-lo.

No dicionário Priberam (Texto Editores), borrada é «derramamento de borra; borratão; sujeira; porcaria; acção indecorosa». Mas também lá consta burrada, que além de designar um conjunto de asnos («burricada»), significa (em linguagem popular) «asneira, tolice, asnice». E há ainda, como sabemos, o termo burrice, que é «estupidez, asneira», além de «teimosia; casmurrice; amuo».

Conclui-se, portanto, que ambos os vocábulos são válidos para designar uma asneira, dependendo da asneira em si e do nosso ponto de vista sobre ela.

A borrada aplica-se à asneira resultante de um derramamento que causa sujidade (tinta, por exemplo); a burrada aplica-se simplesmente à parvoíce. Ora, bem vistas as coisas, se nem todas as burradas são borradas, quase todas as borradas são também burradas... ou não?!

01 outubro 2008

O privilégio e os privilegiados

Quem esteja disposto a pagar bem para ver o espectáculo "Cavalia" poderá optar por «LUGARES PRIVELIGIADOS» - é o que está escrito no portal www.cavalia.pt, na página relativa à compra de bilhetes.

Canso-me de ver este adjectivo mal escrito, mas ele não se cansa de aparecer. Parece que há muita gente que conhece a palavra "privelégios"... E também há os que preferem os "previlégios" e se referem aos "previlegiados"!

O substantivo privilégio, do latim privilegiu, sempre se escreveu assim. Naturalmente, o adjectivo dele derivado é privilegiado, também com dois is antes do e. Mas estas são daquelas palavras que nos pregam partidas quando menos esperamos, porque a forma como as pronunciamos não corresponde à sua grafia.

Cuidado, portanto, ao escrevê-las... não vá o erro tecê-las!