23 setembro 2014

Terçolho, treçolho, ou... ?

Vivendo e aprendendo!
Há dois dias que tenho um malvado terçolho a atormentar-me a vista. Seria uma daquelas ocasiões para me perguntar "mas porque é que isto me foi acontecer?!", se não fosse o facto de eu ter descoberto muito claramente que o malandro veio para me ensinar como se pode escrever e dizer o seu nome!
Durante um dia, andei a dizer a quem me perguntava o que eu tinha que era um "torçolho", até que algumas amigas observaram que não sabiam que se dizia "torçolho", pois sempre haviam dito "treçolho". E ainda manifestaram a sua satisfação por terem sido finalmente esclarecidas! Assim que ouvi isto, soou uma capainha na minha cabeça: "e se....?"
Fui ao dicionário confirmar a minha suspeita: quem estava enganada era eu! Vergonha das vergonhas, assumo. Imaginava que a palavra tivesse duas ou três grafias e pronúncias possíveis, mas nunca pensei que a minha preferida não era legítima!... Verifiquei, pois, que se pode empregar terçol, terçogo, terçolho e até treçolho, mas nada de "torçolho". Aparentemente, não vem de "torcer" o "olho" (quem diria....!), mas de "terço" ou "terceiro" , em latim - embora seja desconhecido o motivo desta estranha origem.


02 setembro 2014

PRECARIEDADE e não "precaridade"

Após o nosso envolvimento numa polémica linguística, eis o resultado...




http://www.publico.pt/opiniao/noticia/polemicas-linguisticas-1668151?page=-1

31 julho 2014

(Des)acordo ortográfico: pôr do sol ou pôr-do-sol?


Não me perguntem porquê, digo eu aos alunos, quando ficam perplexos com as regras e as excepções relacionadas com o emprego do hífen nos compostos, sobretudo após o Acordo Ortográfico.
O vocábulo pôr-do-sol suscitou hoje a minha dúvida. No Priberam aparece com hífenes e somos avisados de que no Brasil a grafia é sem. Na Infopédia, informam-nos de que "a nova grafia é pôr do sol" e a forma com hífenes só consta do Dicionário de Língua Portuguesa sem Acordo Ortográfico.
Como fico em dúvida, vou ao Portal da Língua Portuguesa, onde está disponível o texto do AO. Mas ao consultar a Base XV, a redacção do ponto 6 deixa-me desconcertada:

«Nas locuções de qualquer tipo, sejam elas substantivas, adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, não se emprega em geral o hífen, salvo algumas exceções já consagradas pelo uso (como é o caso de água-de-colónia, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa). Sirvam, pois, de exemplo de emprego sem hífen as seguintes locuções:

a) Substantivas: cão de guarda, fim de semana, sala de jantar;
b) Adjetivas: cor de açafrão, cor de café com leite, cor de vinho;
c) Pronominais: cada um, ele próprio, nós mesmos, quem quer que seja;
d) Adverbiais: à parte (note-se o substantivo aparte), à vontade, de mais (locução que se contrapõe a de menos; note-sedemais, advérbio, conjunção, etc.), depois de amanhã, em cima, por isso;
e) Prepositivas: abaixo de, acerca de, acima de, a fim de, a par de, à parte de, apesar de, aquando de, debaixo de, enquanto a, por baixo de, por cima de, quanto a;
f) Conjuncionais: a fim de que, ao passo que, contanto que, logo que, por conseguinte, visto que.»

O problema, como se vê, é o facto de a explicação não ser exaustiva. Ao apresentar-nos apenas alguns exemplos, tanto da regra como da excepção (através das expressões que destaquei a negrito), não permite que os falantes possam inferir o que acontece nos casos não contemplados (como pôr do sol/pôr-do-sol).
Porém, o Portal da Língua Portuguesa tem mais um recurso que pode ser útil: a lista de todas as palavras que mudam com o AO.
se apresenta, então, pôr-do-sol como "Ortografia Antiga", para Portugal, e pôr do sol como "Ortografia Nova".
A dúvida foi-se, mas a perplexidade ficou. Porque não percebo qual o critério para determinar quais são os compostos que mantêm o hífen por serem formas "consagradas pelo uso". Será a data da primeira atestação? Se for, é estranho, porque essa data não é segura nem é conhecida para todas as palavras. Alguém sabe?


10 julho 2014

Dedo anelar ou dedo anular?


Ora aqui está uma boa pergunta: o dedo em que se costuma usa um anel é o dedo anelar ou o dedo anular?

«É óbvio! Se vem de anel + -ar, claro que é o dedo anelar» - dirá muita gente, com razão.

No entanto...

e agora pasmem: também se pode dizer (e escrever) que é o dedo anular, pois em latim a palavra annulāre- tinha precisamente o sentido de "relativo a anel". Trata-se, pois, de uma palavra homónima do verbo anular, que também deriva do latim (annullāre). Confirmem aqui.

Sempre a aprender!

annulāre

anular In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. [Consult. 2014-07-10].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/pesquisa-global/anular

07 junho 2014

Piquenique e não "pic-nic"

Ao contrário do que muitos portugueses pensam, e do que sugere a conhecida campanha publicitária do Continente, a palavra inglesa pic-nic tem em português uma grafia adaptada, que é piquenique.

A forma pic-nic já nem sequer se encontra na Infopédia, por exemplo.

14 maio 2014

Expressar ou exprimir?


Muita gente prefere empregar o verbo expressar, preterindo exprimir, talvez por razões mais emotivas do que racionais, porventura pela sua semelhança com espremer (que aliás não é apenas sonora, mas também semântica e etimológica).
No entanto - surpresa! - exprimir tem mais tradição na nossa língua, uma vez que remonta ao substrato latino (em latim exprimĕre, que significava «exprimir; espremer; fazer sair»), ao passo que expressar é uma sufixação do particípio passado expresso (+ sufixo -ar), que por sua vez é forma do verbo... exprimir!


10 abril 2014

Compensador ou compensatório?


Eis duas palavrinhas que parecem sinónimas e afinal não são, pois compensador significa "que traz benefícios" e compensatório significa "que serve para compensar". Tudo fica mais claro com exemplos:
Quando um determinado tarifário é (supostamente!) vantajoso para o cliente, é compensador.
Quando uma empresa oferece um serviço gratuito a um cliente como forma de o compensar por lhe ter feito uma cobrança indevida, esse serviço é compensatório.
Agradeço à Marta pela dúvida que me colocou, pois também eu aprendi esta diferença, ao tentar responder-lhe!


05 março 2014

"Ensino à distância" ou "ensino a distância"?


Ontem tive a primeira aula de um curso de formação em que o contacto entre os professores e a turma não será presencial, mas feito através da tecnologia ao nosso dispor. Sim, estou a falar de ensino à distância... ou será que devo dizer, como agora se usa mais, ensino a distância?

Apesar de a expressão com à aberto ser muito mais frequente "no meu tempo" (que já lá vai, infelizmente), nos últimos anos começou a levantar-se a dúvida, passou a haver hesitação e depois a ouvir-se, cada vez mais, a forma "ensino a distância", sem contração entre a preposição a e o determinante feminino singular a.

Quem prefere esta última forma encontra um bom esclarecimento no Ciberdúvidas, da autoria de Carlos Rocha. Nele se explica que "a distância" é a forma preferível quando esta não é explícita(por exemplo, na expressão "ensino a distância", uma vez que não sabemos exatamente qual é essa distância); ao passo que a forma "à distância" deve ser reservada para os contextos em que se especifica a que distância as partes se encontram (por exemplo, na expressão "à distância de um clique").

Porém, o autor do artigo adverte-nos para duas ressalvas a fazer:

a) é admissível e conveniente usar a expressão "à distância", mesmo quando esta não é explicitada, se houver a possibilidade de equívoco na interpretação. Por exemplo, se usarmos a combinação "ensinar a distância", damos a entender, erradamente, que a distância é aquilo que se ensina. Nesse caso, já será preferível dizer e escrever "ensinar à distância".

b) a locução "à distância" está consagrada pelo uso, tal como outras do mesmo género, como "à toa", "à nora", "à frente", "à tarde", "à medida", "à desgarrada", "à capela", etc.

Por isso, Carlos Rocha conclui que, embora se possa sustentar que "ensino a distância" é a expressão mais correta, não se pode dizer que a variante "ensino à distância" esteja errada. Aliás, ele próprio acaba por recomendar esta última, o que não deixa de ser curioso.

Ora, quem prefere usar a forma "à distância" tem ainda, neste esclarecimento de Regina Rocha, também disponibilizado no Ciberdúvidas, três boas razões para argumentar em prol dessa opção. De facto, sendo uma expressão há muito cristalizada pelo uso e tratando-se de uma locução adverbial que supõe um complemento implícito ("ensino à distância" implica que é feito à distância que fica entre o professor e os alunos), não há motivo para preferir a forma "a distância" (que nem sequer tem sustentação nas gramáticas). Repare-se em locuções  semelhantes, como "(desenho) à vista", "procedimento) à revelia", "(conta) à ordem", que pressupõem igualmente o complemento "de alguém" e se usam com à e não a.

Posto isto, eu vou continuar a dizer, como diria no meu tempo, que estou a fazer uma formação à distância... e vocês?